Friday, April 06, 2007

O Primeiro Cinema

por David Bordwell e Kristin Thompson

1. A EXPANSÃO INTERNACIONAL DO CINEMA, 1905-1912

A Luta pela Expansão da Indústria Cinematográfica Americana

Hoje Hollywood domina o mercado mundial enquanto um meio de entretenimento. Antes da I Guerra Mundial, todavia, os Estados Unidos ainda não eram o país mais importante economicamente, sendo Londres o centro financeiro do mundo. As firmas americanas atendiam ao mercado interno, estando ausentes dos mercados internacionais, elas competiam no seio da nova indústria. Durante o período 1905-1912, produtores, distribuidores e exibidores americanos tentavam dar uma certa estabilidade à indústria cinematográfica.


O Boom do “Nickelodeon”

Em 1905 os filmes eram mostrados nas casas de espetáculos de variedades, teatros locais, etc. A principal tendência da indústria cinematográfica americana entre 1905 e 1907 era a grande multiplicação dos teatros cinematográficos, isto é, das salas de cinema. Em geral, eram pequenos, com menos de 200 lugares, o ingresso custando um níquel ou um “dime”, daí a explicação do termo “nickelodeon”, cujo programa podia durar de 15 a 60 minutos.

A maior parte dos “nickelodeons” expandiu por várias razões. Seguem os seguintes fatos:

. a mudança de atualidades para filmes com histórias fez com que o cinema se tornasse um entretenimento regular;

. com o sistema de aluguel de filmes, os programas podiam ser modificados várias vezes na semana;

. propiciando grande lucro para os exibidores, estes podiam mostrar programas breves o dia inteiro.

Antes de 1905, os filmes exibidos em geral em teatros de variedades custavam um preço muito alto para os trabalhadores. Os “nickelodeons”, no entanto, deram acesso a uma audiência de massa, composta por muitos imigrantes. Embora os filmes tenham continuado a ser exibidos em casas de “vaudevilles” por alguns poucos exibidores, em 1908, os “nickelodeons” se tornaram a forma principal de exibição. Como resultado muito mais filmes foram necessários, sendo na maior parte estrangeiros produzidos por Pathé, Gaumont, Nordisk, entre outras companhias européias.

Os “nickelodeons” deram início à carreira de vários empresários importantes: Carl Laemmle, fundador da Universal; Louis B. Mayer que se tornou o segundo “M” da MGM – Metro-Goldwyn-Mayer; mais tarde Adolph Zukor na Paramount; William Fox da 20th Century Fox, etc. Todos esses homens iriam ajudar a criar a estrutura básica do sistema de estúdio hollywoodiano durante os anos 1910, que formaria a base da indústria cinematográfica americana durante décadas. Alguns papéis se tornaram centrais como o do produtor. O “star system” ganhou força, celebridades vieram comandar salários enormes e até começaram a produzir filmes por conta própria.


O Princípio do Longa-Metragem

A mudança para programas mais longos e filmes de maior prestígio implicou um investimento na duração dos filmes. No primeiros anos do século, “longa” significava apenas um filme incomum que poderia ser apresentado na publicidade. Durante o boom do “nickelodeon” quando o filme de uma bobina se tornou padrão, a palavra “longa” ainda possuía o mesmo sentido.

No início de 1904, a empresa cinematográfica americana se orientou cada vez mais para a narrativa. Ademais, com a nova ênfase em filmes de uma bobina, as narrativas se tornaram mais longas e necessitavam de vários planos. Os cineastas acharam meios para tornar os filmes narrativos de maior alcance e compreensão para o público. Se de início se buscou uma maior clareza, calcada no regime narrativo de causas e efeitos, uma maior compreensão aliada a ações motivadas psicologicamente ocorreu após 1907.

Contudo, o termo “longa” veio a ser associado também a filmes de maior duração. Antes de 1909, esses eram os filmes típicos de luta ou épicos religiosos, geralmente exibidos em teatros ao invés de “nickelodeons”. Em 1909, alguns produtores americanos começaram a fazer filmes de várias bobinas, dos quais apenas uma parte podia ser exibida por semana, devido ao sistema rígido criado pela Motion Picture Patents Company. Enquanto isso, na Europa o sistema era mais flexível, sendo os filmes de várias bobinas mais comuns.


2. Os Cinemas Nacionais, O Classicismo Hollywoodiano e a I Guerra Mundial, 1913-1919

O período anterior à I Guerra Mundial marcou uma mudança na história do cinema. Apenas no ano 1913, uma série extraordinária de filmes importantes de longa-metragem fora realizada na Europa (França, Alemanha, Dinamarca, Suécia, Itália). O “serial”, filme dividido em vários episódios, apresentados separadamente, emergiu como a forma fílmica maior. Durante essa segunda metade da década, o longa-metragem se padronizou internacionalmente. Enquanto a indústria hollywoodiana estava se estabelecendo, a situação era diferente em outros países. Em suma, em todo o mundo, os cineastas estavam explorando as possibilidades expressivas do estilo fílmico.

Em resumo:

- Durante a primeira década da história do cinema e adiante, a preocupação maior do cinema residia na ação, devido a seu valor de novidade. Assim sendo, durante o período do “nickelodeon”, os cineastas testavam modos diferentes de contar histórias.

- De aproximadamente 1912 em diante: alguns cineastas se deram conta de que a iluminação, a montagem, a interpretação dos atores e o cenário não poderiam apenas esclarecer a ação, mas também aumentar o impacto do filme. Daí se explica o surgimento de composições perturbadoras, de tomadas lentas.

- Em meados dos anos 1910, as cenas individuais num espaço singular deviam ser fragmentadas em vários planos, começando com um “establishing shot” (plano relativamente grande apresentando o contexto de uma cena), seguido por um ou mais cortes para mostrar porções das ações.


No final dos anos 10, o público estrangeiro se maravilhou com a evolução dos filmes americanos. Com efeito, os cineastas americanos tinham explorado o estilo clássico hollywoodiano, a saber, os recursos de ligação entre as diferentes ações buscando maior eficácia e compreensão das narrativas. Os cineastas continuaram usando a montagem alternada em meios cada vez mais complexos.

Em 1917, os cineastas tiveram de trabalhar um sistema de princípios formais que eram padrão no cinema americano. Esse sistema veio a ser o Cinema Clássico Hollywoodiano. Apesar da designação, muitos de seus princípios básicos foram sendo trabalhados antes do cinema se centrar em Hollywood, de fato muitos desses princípios apareceram primeiramente no cinema de outros países.

Como os filmes de longa-metragem se tornaram padrão, os cineastas hollywoodianos estabeleceram linhas gerais mais sólidas para criar intrigas mais legíveis. Nesse sentido, cada personagem possui um conjunto de traços compreensíveis e consistentes. O protagonista hollywoodiano é tipicamente orientado por um objetivo, tentando obter sucesso no trabalho, esportes ou outra atividade. Os conflitos do herói surgem face aos desejos dos outros personagens criando uma luta que é resolvida apenas no final, com o comum “happy end”. Os filmes hollywoodianos reforçam o interesse à medida que apresentam não uma, mas duas linhas de ação interligadas. Quase inevitavelmente, uma delas envolve um romance, que se configura na batalha do protagonista para atingir um objetivo. A trama suscitará ainda suspense face aos conflitos crescentes e os segredos do último instante. Em suma, esses princípios narrativos contribuíram para a garantia do sucesso internacional dos filmes americanos.

1 Comments:

Blogger Unknown said...

Olá! Vi um post seu com fragmentos do texto "Manifesto das Sete Artes", de Ricciotto Canudo. Você sabe onde posso encontrar / comprar o texto completo em português? Grata!!! Bárbara Pessoa.

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8:56 AM  

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