Monday, October 10, 2005

Da morte egoísta que desnuda o mundo

Bob Dylan Time Out of Mind

Bob Dylan, provavelmente, é o ser mais egoísta que existe; assentada essa afirmação, deve-se considerar a inabalável verdade: só o que lhe toca, ele passa para suas caudalosas canções. Mas, destarte na sua biografia Chronicles ele deixar claro que é bem menos político do que lhe imputam, ele também deu ao mundo diversas canções libelos. Mas, Time Out of Mind é o cd em que ele pescruta os caminhos tortuosos de seus raríssimos álbuns perfeitos, nele esnoba e exagera na capacidade de cuspir em nós canções em que ele e seu fiapo de voz - mas com talento genial de interpretação - parece sempre dizer ''a letra está aqui e levo essa melodia onde quiser, mas caso-a perfeitamente com a letra''.

Em meio a dezenas de canções lamento, de amores atormentados, relações desfalecidas, ele compôs coisas como Masters of War, Blowin in the Wind, Like a Rolling Stone e outras gemas que dissecaram a sociedade e o tempo político onde cimentou a grande fase de sua criação, ali por Highway 61 Revisited e Blonde on Blonde. Dylan é mais genial, no entanto, quando prega da cadeira de seu reino, não quando visita fronts externos e bandeiras universais. O Blood on the Tracks é, inquestionavelmente, o disco de suas mais geniais canções.

Ao trabalhar temas de incomunicação, morte, amor, destino, Dylan expurgava o fim de seu casamento e de forma única, erigiu blocos sonoros ao mesmo tempo dilacerados enquanto experiência e faixas indestrutíveis enquanto canções. Em Time Out of Mind, dá-se o mesmo traço de brilhantismo, mas como usual em seus melhores álbuns, Dylan não obteve unanimidade de público e crítica.Os melhores álbuns apontados por estes sempre foram os já citados Blonde on Blonde e o Highway 61 Revisited.

Eu considero mais certeiros e acurados os álbuns Infidels, Blood on the Tracks e esta obra-prima que é o Time out of Mind. O fanhoso, assim como Chico Buarque, é um dos maiores interprétes de todos os tempos. ''Sou quase um Caruso, canto tanto quanto ele'', disse uma vez. E não só a voz como toda a engendragem e sons do trabalho mais genial do bardo servem a uma atmosfera difícil e pessimista, num manifesto genial da inquietação e mal estar de um indivíduo e do mundo, estes um só corpo dolorido, indisssociáveis.

Os sons são fantasmagóricos, uma guitarra que desenha algo no ar, sai e dá lugar a uma bateria por vezes moribunda e noutras sutil, uma voz ineditamente mais nítida, tudo a serviço da coleção de mortais faixas do cd. O som de uma tarde instantaneamente irrompida por uma tempestade que vai se esguiando pelo resto dos dias teria a trilha sonora com o Time Out of Mind. Seja a amante que o deixou ou a busca de redenção mesmo que em morte, as letras de Dylan emolduram um som que prenuncia apenas o fim, mesmo que reconheça que ainda não está escuro, mas vai ficar.

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