Madame Satã mostra força com direção criativa e verdade das atuações
Madame Satã
Por Ricardo Paiva
Madame Satã, filme dirigido por Karim Anouiz, estréia em circuito nacional e pelos elogios colhidos junto a crítica, além da violência presente em sua temática, vem se juntar a Cidade de Deus como representantes de sucesso da safra recente do cinema nacional. A película é baseada na biografia do lendário Madame Satã, publicada pela coleção Encanto Radical e escrita por Rogério Durst.
O diretor centrou a produção na década de 30, mais especificamente em 1932, o período mais conturbado da vida de João Francisco dos Santos, o Madame Satã. João, que nasceu em 1900 e morreu em 1976, foi um pernambucano de Glória do Goitá que migrou para o Rio de Janeiro. Mas, além de nordestino, era negro, homossexual, pobre e transformista. Tendo tais características, foi descriminado durante toda a sua vida e virou lenda na história cultural da Lapa e do Rio de Janeiro por não se curvar às agressões e humilhações que sofria pela sua condição. Alvo de preconceito, João sempre se envolvia em brigas e confusões e brigava freqüentemente com policiais.
FORÇA NA TRAGÉDIA - O filme é uma obra densa, carregada emocionalmente e muito intensa, assim como foi a vida do mítico Madame Satã. Karim optou por dedicar grande parte do filme ao ano de 1932, pois foi nele que o personagem principal, até então camareiro da atriz e cantora Vitória dos Santos, deu um novo rumo a sua vida. Nos bastidores do show de Vitória, João sonhava em ser ele a estrela do espetáculo e da noite carioca. Homem sensível, ia de reações mais ternas como as que oferecia a sua família até reações violentas nas ruas. Vivia com Laurita, prostituta que ele acolheu quando chegou na cidade, assumindo sua filha e convivendo com elas e Tabu, também homossexual e companheiro de profissão em programas. João não aceitava ofensas, pois tinha elevada auto-estima. Era um sonhador, amava a vida e por isso sentia grande revolta interior quando era negado a ele e as pessoas que amava, o direito de viver com dignidade.
Amigo de Amador, dono do bar Danúbio Azul, convence o amigo a deixar apresentar seu show, onde cantava e dançava. Depois do Danúbio, vive um turbilhão de emoções e mudanças na vida. No bar, João brilha com suas performances. Na frente do bar, João mata. No universo marginal da noite, vai conhecer seu amor Renatinho, arrumaria outras várias brigas e desavenças. O lado lúdico e ameno da vida de João se realizava nessas noites, onde ele podia brilhar e alcançar o glamour que de dia lhe era negado pela sociedade que insistia em lhe descriminar e cruzar seu caminho.
UM FILME DE ATORES - Nessa jornada pela dignidade, a trama do personagem é defendida com maestria pelo jovem ator Lázaro Ramos. O ator, de personalidade discreta, parece que em cena incorpora algo e busca forças no além para encarnar o a figura lendária e trágica que foi Madame Satã. A força do filme reside principalmente nas interpretações tocantes de Marcélia Cartaxo como Laurita, Flávio Bauraqui como Tabu e especialmente do duelo de interpretação entre Lázaro e Emiliano Queiroz, o Amador. As poucas cenas de Lázaro com Emiliano são especialmente bonitas, pois marcam o que para João seria o início do sucesso e a esperança de uma vida feliz. No bar do amigo, após seus primeiros shows, ele sonhava alto e para um desatento, porém afetuoso amigo, falava parecendo estar em outro mundo. João queria e achava que poderia ser uma estrela da noite.
QUALIDADES TÉCNICAS – Madame Satã foi uma lenda justamente pelas atitudes explosivas, pela expansividade, alegria e pela intensidade com que vivia. Talvez, por isso, o filme é dono de uma estética toda especial, com fotografia perfeita e de cores fortes. Os movimentos de câmera parecem existir para definir os estados emocionais dos personagens. As cenas são guiadas pelas emoções e pelo forte componente emocional do enredo e trazem uma linguagem ousada e colorida, caracterizando bem o que era o mundo de João. A estética não poderia ser contida, nem o filme poderia ser sem vida. As sensações são preponderantes na estória e as críticas feitas ao estilo e a alusão à cosmética de Cidade de Deus talvez não caiba aqui.
O filme é bem resolvido na sua proposta: enfocar um curto, porém rico período de vida de uma instigante figura humana. Mesmo não tendo a perfeição técnica que foi apontada pelos críticos em Cidade de Deus, a obra é um notável retrato dos excluídos. Talvez o maior mérito do diretor resida aí. Na tentativa de diminuir o espectro de análise sobre um especial personagem e sua família, o filme revela com mais profundidade o mundo interior e a violência de um ser humano sensível e revoltado com sua condição.
Por Ricardo Paiva
Madame Satã, filme dirigido por Karim Anouiz, estréia em circuito nacional e pelos elogios colhidos junto a crítica, além da violência presente em sua temática, vem se juntar a Cidade de Deus como representantes de sucesso da safra recente do cinema nacional. A película é baseada na biografia do lendário Madame Satã, publicada pela coleção Encanto Radical e escrita por Rogério Durst.
O diretor centrou a produção na década de 30, mais especificamente em 1932, o período mais conturbado da vida de João Francisco dos Santos, o Madame Satã. João, que nasceu em 1900 e morreu em 1976, foi um pernambucano de Glória do Goitá que migrou para o Rio de Janeiro. Mas, além de nordestino, era negro, homossexual, pobre e transformista. Tendo tais características, foi descriminado durante toda a sua vida e virou lenda na história cultural da Lapa e do Rio de Janeiro por não se curvar às agressões e humilhações que sofria pela sua condição. Alvo de preconceito, João sempre se envolvia em brigas e confusões e brigava freqüentemente com policiais.
FORÇA NA TRAGÉDIA - O filme é uma obra densa, carregada emocionalmente e muito intensa, assim como foi a vida do mítico Madame Satã. Karim optou por dedicar grande parte do filme ao ano de 1932, pois foi nele que o personagem principal, até então camareiro da atriz e cantora Vitória dos Santos, deu um novo rumo a sua vida. Nos bastidores do show de Vitória, João sonhava em ser ele a estrela do espetáculo e da noite carioca. Homem sensível, ia de reações mais ternas como as que oferecia a sua família até reações violentas nas ruas. Vivia com Laurita, prostituta que ele acolheu quando chegou na cidade, assumindo sua filha e convivendo com elas e Tabu, também homossexual e companheiro de profissão em programas. João não aceitava ofensas, pois tinha elevada auto-estima. Era um sonhador, amava a vida e por isso sentia grande revolta interior quando era negado a ele e as pessoas que amava, o direito de viver com dignidade.
Amigo de Amador, dono do bar Danúbio Azul, convence o amigo a deixar apresentar seu show, onde cantava e dançava. Depois do Danúbio, vive um turbilhão de emoções e mudanças na vida. No bar, João brilha com suas performances. Na frente do bar, João mata. No universo marginal da noite, vai conhecer seu amor Renatinho, arrumaria outras várias brigas e desavenças. O lado lúdico e ameno da vida de João se realizava nessas noites, onde ele podia brilhar e alcançar o glamour que de dia lhe era negado pela sociedade que insistia em lhe descriminar e cruzar seu caminho.
UM FILME DE ATORES - Nessa jornada pela dignidade, a trama do personagem é defendida com maestria pelo jovem ator Lázaro Ramos. O ator, de personalidade discreta, parece que em cena incorpora algo e busca forças no além para encarnar o a figura lendária e trágica que foi Madame Satã. A força do filme reside principalmente nas interpretações tocantes de Marcélia Cartaxo como Laurita, Flávio Bauraqui como Tabu e especialmente do duelo de interpretação entre Lázaro e Emiliano Queiroz, o Amador. As poucas cenas de Lázaro com Emiliano são especialmente bonitas, pois marcam o que para João seria o início do sucesso e a esperança de uma vida feliz. No bar do amigo, após seus primeiros shows, ele sonhava alto e para um desatento, porém afetuoso amigo, falava parecendo estar em outro mundo. João queria e achava que poderia ser uma estrela da noite.
QUALIDADES TÉCNICAS – Madame Satã foi uma lenda justamente pelas atitudes explosivas, pela expansividade, alegria e pela intensidade com que vivia. Talvez, por isso, o filme é dono de uma estética toda especial, com fotografia perfeita e de cores fortes. Os movimentos de câmera parecem existir para definir os estados emocionais dos personagens. As cenas são guiadas pelas emoções e pelo forte componente emocional do enredo e trazem uma linguagem ousada e colorida, caracterizando bem o que era o mundo de João. A estética não poderia ser contida, nem o filme poderia ser sem vida. As sensações são preponderantes na estória e as críticas feitas ao estilo e a alusão à cosmética de Cidade de Deus talvez não caiba aqui.
O filme é bem resolvido na sua proposta: enfocar um curto, porém rico período de vida de uma instigante figura humana. Mesmo não tendo a perfeição técnica que foi apontada pelos críticos em Cidade de Deus, a obra é um notável retrato dos excluídos. Talvez o maior mérito do diretor resida aí. Na tentativa de diminuir o espectro de análise sobre um especial personagem e sua família, o filme revela com mais profundidade o mundo interior e a violência de um ser humano sensível e revoltado com sua condição.
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